Aquele que trazia uma vinha guardada

António Cabral na Pedra Furada, vinha duriense da família (anos 70)

A António Cabral, no 5.º aniversário da sua morte

Aquele que trazia uma vinha guardada
na gaveta mais íntima da alma
não pode ter morrido.

Digamos que emigrou,
com vontade de um dia regressar,
voltar a ver o rio, afagá-lo
como se afagam as cãs de um velho pai.

Felizmente para nós,
não pôde levar na mala breve
os seus papéis, os seus livros, a viola
que dedilhava em pensamento
e nos fazia dedilhar a nós.

De modo que, enquanto não regressa,
a sua voz continua a nosso lado,
indicando caminhos, desbravando
matagais que ocultam a esperança.

Poema inédito de A. M. Pires Cabral, a integrar o próximo livro de poesia do autor.

A. M. Pires Cabral

A. M. Pires Cabral nasceu no concelho de Macedo de Cavaleiros em 1941. É licenciado em Filologia Germânica pela Universidade de Coimbra. A sua actividade literária estende-se pelas áreas da poesia, ficção, teatro, crónica, antologia e ensaio. Estreou-se em 1974 com Algures a Nordeste, poesia, e tem publicadas cerca de 50 obras. Está representado em inúmeras antologias e tem colaboração dispersa por numerosas publicações. Uma recolha de poemas seus está traduzida para alemão com o título Irgwedwo im Nordosten (bilingue), o conto “Vilar Frio” foi publicado em França (também em edição bilingue), o romance O Cónego foi traduzido para italiano, o livro de poemas Algures a Nordeste para castelhano, está em preparação uma antologia poética em italiano, tem poemas traduzidos para inglês na Poetry International Web e textos narrativos traduzidos para castelhano e húngaro.
Recebeu os seguintes prémios literários:
1983 – Prémio Círculo de Leitores, pelo romance Sancirilo.
2006 – Prémio D. Dinis, pelos livros de poesia Douro: Pizzicato e chula e Que comboio é este.
2008 – Grande Prémio de Literatura DST, pelo romance O Cónego.
2009 – Prémio da Fundação Luís Miguel Nava, pelo livro de poemas As Têmporas da Cinza.
2010 – Prémio Pen Club de Poesia, pelo livro Arado.
Animador cultural, foi um dos responsáveis pela organização das «Jornadas Camilianas», que se realizaram durante oito anos consecutivos em Vila Real. Integrou a Comissão Nacional para as Comemorações Camilianas (1990) e presidiu à Comissão Instaladora do Círculo Cultural Miguel Torga.
A. M. Pires Cabral, homem de fundas raízes rurais, tem procurado dar voz, na sua obra, à cultura popular trasmontana. Uma parte muito significativa da sua obra literária tem como referente a realidade social de Trás-os-Montes.

Obras recentes do autor:

POESIA: Douro: Pizzicato e Chula (2004); Que comboio é este (2005); Antes que o rio seque (2006); As têmporas da cinza (2008); Arado (2009). PROSA: Trocas e baldrocas ou Com a Natureza não se brinca  (2007); Il Canonico (tradução italiana do romance O Cónego) (2009); O porco de Erimanto (2010); O diabo veio ao enterro (2010); Os anjos nus (2012)
[Ver bibliografia completa].

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