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Prosa & Poesia – Crónica | Em memória do poeta, ficcionista, cronista, ensaísta, dramaturgo, etnógrafo e divulgador da cultura popular portuguesa

  • A compridíssima mesa, feita de mesas sucessivas. Foto por Fernando DC Ribeiro. Mezinha de S. Sebastião

    A compridíssima mesa, feita de mesas sucessivas. Foto por Fernando DC Ribeiro. Professor que sou, fiz há tempos o plano de uma visita de estudo à Mezinha de S. Sebastião, em Couto de Dornelas no concelho de Boticas, visita que também podia efectuar-se aos lugares de Samão e Gondiães que ficam ali perto, já no [...] Continuar a Ler
  • Vendedores de melão Dê-me aí lume, ó chefe

    Assim, com este pirótico chamadouro, fui abordado num areal de Vila Nova de Mil Fontes. E isso não me chamaria especial atenção, se durante a viagem, dois dias antes, ao longo de seiscentos quilómetros, rumo à foz do Mira (onde os cinquenta condenados para ali enviados por D. João II, na “mira” de povoamento, torceram o nariz – incrível!), eu não viesse a ser alvejado parecidamente, de paragem em paragem. O que me fazia sorrir. A mim e a três familiares, quando, depois de alertados, se puseram de ouvido à coca.

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  • Balão de São João Aquele São João

    O que ninguém viu, salvo uma senhora, e eu também não vi, ia lá ver essas coisas naquele tempo, foi aparecer um fantasma junto à cascata. Mas vamos por partes.

    Na rua em que nasci acendiam-se lamparinas na noite de São João. E também se deitava um balão, pelo menos. Era vê-lo a subir para as estrelas. E eu, ainda pirralho, pensava que as estrelas, sobretudo a lua, iam ficar contentes com a companhia e não lhes dava para caírem na rua em cima de nós. As lamparinas suspensas de meia dúzia de arames de vinha, essas é que eram o meu encanto. Grisetas de azeite a bruxulearem no fundo dum copo de papel de seda, as lamparinas atraíam os olhos da pequenada que luziam com elas.

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  • Quilhõezinhos de S. Gonçalo, doce de forma fálica popular durante as festas amarantinas. S. Gonçalo de Amarante

    Por ter querido fugir ao Inverno, a grande festa de Amarante transferiu-se do dia de S. Gonçalo, 19 de Janeiro, para o primeiro sábado de Junho, conservando-se em Janeiro a celebração religiosa e diversificando-se em Junho os folguedos, sem esquecer a memória do santo popular. Popular a valer, especialmente invocado como casamenteiro das velhas, conforme reza longa tradição. Tal aura prodigiosa não se sabe lá muito bem quando principiou; ela, porém, tem-se mantido, com alguma apreensão das raparigas solteiras de cujas – pelo visto legítimas – queixas ficou a célebre quadra:

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  • Leitão à Bairrada A confraria gastronómica D. Leitão

    Como sei de uma confraria etnogastronómica (Os Pyjamantes – tema já em agenda) que assina o ponto uma vez por ano, comendo-se e bebendo-se, cantando-se, contando-se, não digo para o ano inteiro, mas quase, despertou-me a atenção um texto gaiato que acabo de ler numa fresca revistinha de Pampilhosa do Botão. A dos caminhos de ferro, a que fica ali a dois passos pantagruélicos de Coimbra. Pantagruélicos, pois – de Pantagruel, aquele herói do francês Rabelais (séc. XVI) que gostava de mesa lauta e vinhos cintilantes.

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  • Trabalho agrícola, por Luís Borges A pequena exploração agrícola

    O Douro não é só vinhedos espraiados nas ladeiras voltadas ao rio e nas zonas mais altas, frescas e menos acidentadas: é também a quintarola ou granja de pequenas dimensões, o quintal à beira da casa de habitação ou dela afastado – o praediolum dos romanos.

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  • Matança do porco por Luís Borges Matança do porco

    Gordo, gordinho, matulão, o porco chega ao terreiro, conduzido por aquele que havia de lhe pôr termo aos dias de ceva. Mirones, apesar do chuvisco frigidíssimo. Motivo para estar ali um garrafão encarapuçado por um púcaro de alumínio. «Vai um?» «Claro!» Dantes, já lá vão uns anitos, quando eu assistia ao ritual, reparava em um ou dois molhos de palha que se destinavam a faxucar o animalzinho; agora olho, com alguma nostalgia, para uma botija de gás. O fumo da palha tinha outro encanto, carregada que era de símbolos sacrificiais.

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  • Caldeireiro O caldeireiro

    Caldeireiro Quando o tempo começa a tartamudear e os primeiros calafrios ameaçam a folhagem, o caldeireiro assoma à boca da rua. Aí vem ele. Da mão pinga-lhe uma sertã em cujas costas martelinho ligeiro, repenica, como se ela estivesse com soluços. Todo o bicho-careto, especialmente o gado fraldeiro, mete o nariz por janelas e janelos, [...] Continuar a Ler
  • Lourenço Fontes (2013) Bruxos & curandeiros

    Lourenço Fontes por Leonel de Castro (2013) Não sou dado a acreditar nos poderes ocultos de bruxos e curandeiros, relativamente à solução de problemas psíquicos e orgânicos que a ciência não resolve ou tem dificuldade em resolver. Mas entendamo-nos: lá que certas pessoas, que os consultam, veem os seus padecimentos desaparecerem ou atenuarem-se - disso [...] Continuar a Ler
  • Casamento de arromba

    Quando cheguei, dei logo conta de que o meu 2CV destoava dos automóveis de luxo que reluziam no largo e pelas ruelas do Fiolhoso (até ouvi um puto dizer, mãos nos bolsos e nariz apontado: “Ah, este é o melhor!”), ruelas onde também velhas casas de blocos de cantaria, meio destelhadas e de portais caídos ou em via disso, destoavam de moradias azulejadas, garridas, com tratores a apanharem o sol em amplos logradouros. A aldeia fica num planalto do concelho de Murça e quase se liga à Levandeira e ao Cadaval que lhe pertencem como freguesia. Algum vinho meio verdasco, milho, castanhas e batatas.

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