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Corrida de caracóis
Num verão dos anos 50, o Padre Adolfo Magalhães anunciou no Vidago, onde era pároco, uma corrida de caracóis. Os aquistas daquela estância termal acorreram em grande número ao salão do hotel onde o feito ia realizar-se. Muito simples. Em cima de uma mesa, o padre fantasista e bem humorado colocou dois caracóis esfomeados, à [...] Continuar a Ler -
Um passeio no Rio Douro
Terminou o nosso passeio. Douro arriba, quando o autocarro passou a cavaleiro de Mazouco. De Barca de Alva até ali, com tantas curvas entre vinhas, olivais e manchas de um verde esmaecido de amendoeiras, alguns laranjais também, estes de cor mais pimpona, ao aconchego do regadio, impressionou-me o Penedo Durão com seu arreganho para terras [...] Continuar a Ler -
As panelas suspensas
Na Idade Média praticavam-se as cavalhadas (do castelhano caballadas), torneios de cavaleiros que, com um pau ou uma cana e cavalo à desfilada, procuravam tocar em objetos suspensos de uma corda. O jogo das panelas com burro terá aí a sua origem. Espécie de imitação burlesca. Mas este jogo pode dispensar, como mais acontece, os [...] Continuar a Ler -
Onde se fala de mortos vivos
Quando a noite invade brejos e fundões, encruzilhadas, descampados, casarões e especialmente os cemitérios, a imaginação humana tende a ser também invadida pelo sentido do oculto e pela insegurança, o que não raro está na origem de bizarras ilusões e alucinações em que falsamente se percepcionam coisas do arco da velha. “Era a mão dele, fria como o gelo, que me apertava a garganta. Até acordei sobressaltada, banhada em suor”. “Olha, foi ali: a feiticeira saiu-me da esquina, pôs-se a dançaricar e a rir-se de mim a descarada”. “O lobisomem vinha com a aguilhada, em cima de um cavalo que corria a toda a brida; foi por Deus que me desviei, se não furava-me os olhos”. “Eu vi-o, eu vi-o, juro-te: dois olhos a arder e as manápulas a virem para mim; era o ti Belisário a sair da campa: lá tinha coisa que o chamasse, porrinha!, não sei como escapei”, etc.
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O Orfeu rebelde
Miguel Torga por Bottelho Quando em 1962 escrevi sobre ele um texto que posteriormente vim a publicar, não descansei enquanto não lho mostrei na sua casa de S. Martinho de Anta. Estava acompanhado da esposa e eu lia, prescrutando-lhe os gestos, que sempre lhe rebentavam de dentro, como renovo de mato bravio. Sabia já que [...] Continuar a Ler -
Os formigos
O automóvel chega às Taipas, desliza por uma rua prolongada entre muretes e coisas verdes e pára, segundo o combinado, junto do tal limoeiro. Uma pena que aquele pinheiro manso, farfalhudo como um discurso, não estivesse também ao alcance da mão.
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Os Pyjamantes
Existe em Vila Real, desde 1956, uma confraria que não tem outra finalidade do que comer bem, beber melhor e encarar a vida com um sorriso permanente, pelo que os pyjamantes se reúnem uma vez por ano, convencidos de que os anos são sempre muitos no calendário da fraternidade em festa. O sábado que precede [...] Continuar a Ler -
Magustos
'Magusto' por Adriano Martins Quem entre o dia de Todos os Santos e o dia de S. Martinho, sobretudo neste, não participou num magusto em plena montanha, sentindo-se livre como um animal bravio, como ele cheio de olhos para as coisas em volta, a projectar uma sombra partilhada pelos convivas e pelo vento, bem pouco [...] Continuar a Ler -
Paisagem cultural duriense
Estou há meia hora debaixo da ramada, a quarenta e cinco passos do portão, atento ao que vai na rua. Ainda não vi um homem a cavalo: vê-se cada vez menos. Pouca gente e alguns carros — sinal de quê? Um rapaz de pólo sanguíneo atrai-me a atenção: atira com uma bola ao ar, não [...] Continuar a Ler -
Emigrantes
Portugal cheiinho de emigrantes. A rebentar pelas costuras. A transbordar. Nas aldeias, nas vilas e nas pequenas cidades do interior os emigrantes dão nas vistas: carros que voam, dinheiro a luzir, a alegria dum abraço. Tudo ruidoso. A saudade das férias. A esperança reanimada ao calor das noivas e das mães. Alguns sonhos partidos, é [...] Continuar a Ler