E O RIO quem o vê erguer-se do leito e pousar as formosas vogais, de vinha em vinha? O rio tem a forma dum sexo em pleno voo.
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Daniel Gonçalves
Prémio Literário António Cabral 2013 Fotografia por Emily Goodhart (Unsplash) Poema com Mário Cesariny: como uma canção desesperada estou a dizer-te que já todos os poetas inventaram o amor que nas minhas mãos o amor é apenas silêncio que vaza que o amor não pode ser mais belo do que este verso: antes de conhecer-te [...] Continuar a Ler -
O homem que fugiu com o rio às costas
Nesta aldeia ainda vivem algumas pessoas que ao olharem para trás se codificam nas crenças insolúveis como areias que umas sob as outras ficam. Feiticeiras continuam a dançar na encruzilhada, algumas com dentes sãos pilhados a moribundos. Aqui havia um moinho, ali um lagar de xisto, naquele ramo de freixo um pescador se enforcara. Sexta-feira, [...] Continuar a Ler -
Na noite de S. João
Na noite de S. João, roubei-te os vasos, Maria. Ficaram-te dois no peito que hão-de ser meus, algum dia.
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Ratos no sotão
Campanha de alfabetização. Foto de Alfredo Cunha. A Francisco Fanhais Esta gente não repara no que vai à sua frente. Nunca pára nem compara. Ai esta gente que gente! Outros escrevem a história; esta gente aceita a escrita. Roubam-lhe tempo e memória. Esta gente nem medita. Andam ratos pelo sótão do nosso belo país. Esta [...] Continuar a Ler -
Homo, mensura
Eu não irei convosco, puros habitantes do sonho. O meu lugar é aqui, entre os homens: falo a sua linguagem, sinto as suas dores e tenho a consciência bem agarrada à carne e ao espírito – os dois poços em que nasce, desagua e se debate a impetuosa água do meu pensamento. Que me importam […]
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A turba
À memória do grande poeta e amigo António Cabral A turba engole-me em sentidos Pela manhã o disco referve A minha antefebre esta volúpia De aromas e cores Vejo-te do arco Dizes-me Para que me debruce na minha vez E não escorregue na vertigem Silencio-me Deixo Que o Douro exale A minha circunstância É ser [...] Continuar a Ler -
Padre Max
Padre Max Ver os destroços do automóvel, o teu corpo ainda. E os dias cumprindo o arco, oh borboletas de fogo! Quem se atreverá a plantar-te na memória? «Foi melhor assim» - disseste, dentro já da inconsútil ideia oferecida. Era quase manhã: anoitecia o teu espírito visível nas estrelas. Digamos que não morreste, a bomba [...] Continuar a Ler -
Sob os álamos
Generalidades, generalidades… Só a poesia é gloriosamente múltipla: o relevo de cada ser, uma gruta.
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A neve
Veio de noite, silenciosa, E tentou abafar, sob a penugem Das asas, o clamor desta miséria. Mas o vento soprou, enrodilhou-a E deixou-a Ensanguentada, à beira do caminho. E foi aí que o sol, doido varrido, A apunhalou, Comendo-a ferozmente, voluptuoso.
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